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31/07/2019 16:03h - Porto Velho - Andrey Cavalcante

Morde e assopra - II Por Andrey Cavalcante

Andrey Cavalcante - Conselheiro federal e ex-presidente da OAB/RO

Estima-se que cerca de 6% da população é portadora de transtorno de personalidade antissocial. São pessoas que não fazem distinção entre certo e errado e não consideram os direitos, desejos e sentimentos dos outros. Por isso mesmo são freqüentemente diagnosticadas como portadores de psicopatia. Estudiosos elencam os principais sintomas: uso persistente de mentiras, capacidade de manipulação, egocentrismo, senso de superioridade, vaidade e exibicionismo, dificuldades recorrentes com a lei, hostilidade, irritabilidade significativa, agitação, impulsividade, agressividade e violência, ausência de empatia com as outras pessoas e de remorso por prejudicá-los. A explicação é de um conhecido psicoterapeuta, para quem a sugestão de meu artigo anterior, "Morte e Assopra", que aponta sintomas do problema no comportamento do excelentíssimo senhor presidente da república, Jair Bolsonaro, é apropriado. Mesmo para qualquer neófito em psiquiatria, os indicativos afloram repetidamente a cada manifestação de sua personalidade. Basta observar que, agora mesmo, sem qualquer traço de remorso, ou do sentimento cristão que tanto apregoa, ele se vinga na família do presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz, ao reabrir uma chaga que agride a todos que sofreram e ainda sofrem com a impossibilidade de oferecer uma sepultura digna a seus mortos. O problema é que, no geral, o portador desse transtorno somente procura ajuda de um psiquiatra quando enfrenta problemas legais ou é forçado por decisão judicial. Isso pode estar perto de ocorrer. Segundo a colunista Mônica Bergamo, pelo menos sete ex-presidentes da OAB já se ofereceram para assinar, como advogados de Felipe Santa Cruz, sua interpelação no STF, para exigir esclarecimentos sobre os ataques à memória de seu pai, Fernando Santa Cruz. Os ex-presidentes Cezar Britto, Marcus Vinicius Coelho, Ophir Cavalcante, Marcelo Lavenére, Roberto Busato, Reginaldo Oscar de Castro e Roberto Batochio certamente serão acompanhados na iniciativa por outros ex-dirigentes da entidade, diz a colunista. O absurdo de toda essa situação é que o presidente teria uma oportunidade ímpar de conseguir sucesso em seu mandato presidencial - e assegurar a própria reeleição - se decidisse apenas governar. Claro que com algumas correções indispensáveis no Ministério. Exemplo disso foi a espetacular vitória na votação da reforma da Previdência. Mas ele não consegue se controlar. "Precisaria de uma mordaça", disse o ministro Marco Aurélio Mello, do STF. A própria agressão à memória do pai de Felipe Santa Cruz - e, de resto, a todos os demais desaparecidos durante o regime militar, nos "chamados anos de chumbo" - evidencia sintoma claro dos efeitos do transtorno de personalidade antissocial sobre o comportamento do presidente. Ele cancelou, à última hora, uma audiência com o ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Yves Le Drian, cuja pauta seria o importantíssimo acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, para cortar os cabelos e gravar uma live. E voltar a usar a memória do pai para se vingar do presidente da OAB. A razão para o ódio vingativo de Bolsonaro contra a advocacia nacional tem origem em outro sintoma de sua personalidade. Isso nada tem a ver com Adélio, Bolsonaro ou com o presidente da OAB. Imagine-se: caso a prática se generalizasse, todo advogado passaria a ser um investigado junto com o seu cliente, ainda que não houvesse nenhuma evidência de crime. Assim, todos os penalistas do país viveriam em situação de permanentemente investigados pela polícia. O presidente não nutre qualquer respeito pela constituição e pelas leis. E a OAB delas jamais se afasta. Na investigação do atentado de Juiz de Fora a Ordem atuou contra a tentativa de quebrar o sigilo telefônico do advogado de Adélio Bispo, em defesa das prerrogativas constitucionais da defesa. Foi o bastante para um Bolsonaro, indignado, acusar a OAB de ter impedido a investigação do telefone de Adélio. O desmentido da própria Polícia Federal obrigou-o a corrigir o discurso, mas com certeza agravou sua fúria vingativa. A agressão à memória de Fernando Santa Cruz de Oliveira começou a ser construída a partir daí, à espera da oportunidade para se manifestar. A reação contra a indignidade cometida só não foi maior que a enormidade do desprezo manifestado pela dor alheia. Nota da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do MPF, indica que o crime de desaparecimento forçado é permanente, ou seja, sua consumação persiste enquanto não se estabelece o destino ou paradeiro da vítima. Toda pessoa que tenha conhecimento do destino ou paradeiro da vítima e intencionalmente não o revele à Justiça pode ser, inclusive, considerada partícipe do delito. Qualquer autoridade pública, civil ou militar, e especialmente o Presidente da República, é obrigada a revelar quaisquer informações que possua sobre as circunstâncias de um desaparecimento forçado ou o paradeiro da vítima.

Fonte: Andrey Cavalcante

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