Entidades denunciam ação de pistoleiros em Machadinho D’Oeste
Entidades e pesquisadores visitam Machadinho D’Oeste e coletam denúncias sobre pistolagem contra posseiros. Grupo paramilitar "Invasão Zero" é liderado por Gesulino Castro, condenado a 35 anos por chacina em Buritis/RO.
A AÇÃO DAS ENTIDADES
A denominada “Missão de Solidariedade” foi organizada pelo Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos (CEBRASPO) e ocorreu nos dias 12 e 13 de abril de 2025 para ouvir camponeses e camponesas da área Gedeon José Duque, alvo de ataques de pistoleiros nos últimos dias; além de verificar in loco as condições físicas e emocionais das famílias, coletar depoimentos e registro dos incidentes e realizar visita as áreas camponesas Valdiro Chagas, Gonzalo e comunidades das adjacências no município de Machadinho D’Oeste.
“Com base nos dados coletados, a Missão também se propôs a produzir um relatório circunstanciado, com base na coleta de informações que eventualmente identifique crimes cometidos por pistoleiros (guaxebas), latifundiários, agentes das forças de Segurança Pública e de outros órgãos estatais, além de levantar possíveis omissões do Poder Público. O Relatório, após concluído será enviado para o conjunto de entidades de defesa de Direitos Humanos a nível regional, nacional e internacional; bem como a entidades de classe e movimentos sociais”, relata a presidente do CEBRASPO, Maria de Fátima S. de Andreazzi, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Durante dois dias a comissão realizou visitas a moradores das áreas camponesas Valdiro Chagas, Gedeon, Gonzalo e Amigos do Campo. Além de coletar informações, depoimentos, realizar registros fotográfico das produções e atendimento médico, a comissão acompanhou a realização de uma Assembleia na área Valdiro Chagas e pode acompanhar os preparativos de organização de um ato público (preparação de alimentos, confecção de bandeiras, faixas, etc.) além de compor a mesa do ato realizado no domingo, 13 de abril. Mais de 130 pessoas participaram desta atividade, onde famílias camponesas puderam denunciar inúmeras violências sofridas. Ao final da atividade, grande parte dos participantes tomou parte na leitura de um manifesto e solicitaram que fosse encaminhado a todos os Órgãos públicos e à imprensa.
A atividade de coleta de depoimentos foram realizadas em conjunto com pesquisadores do Laboratório de Gestão do Território (LAGET/UNIR), do Grupo de Pesquisa em Gestão do Território e Geografia Agrária da Amazônia (GTGA/CNPq); de pesquisadores do Grupo de Pesquisa História, Sociedade e Educação no Brasil (HISTEDBR-UNIR); de Pesquisadores do Núcleo de Estudos Históricos e Literários - NEHLI/IFRO; de integrantes do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES-SN, da Executiva Nacional de Estudantes de Pedagogia (ExNEPe); do Diretório Central dos Estudantes/DCE-UNIR e Centros Acadêmicos, além de representação do CEBRASPO, ABRAPO e de correspondentes de imprensa.
CHEFE DA PISTOLAGEM IDENTIFICADO E CRIMES COMETIDOS
Pânico e terror eram visíveis nos rostos das dezenas de famílias que se encontravam reunidas. Crianças, mulheres e homens tiveram que deixar seus barracos, após o início dos ataques que ocorreram no dia 30 de março, quando Gesulino Cesar Travagine Castro, incendiou a entrada do acampamento e avançou com um grupo de pistoleiros fortemente armados.
O chefe da pistolagem fez questão de postar suas ações na rede social Instagram, que mostra o local onde havia a placa da entrada do acampamento destruída e incendiada e a cerca que começaram a construir na área. No momento da destruição, os pistoleiros afirmaram no vídeo que estavam cumprindo “reintegração de posse que o juiz ordenou”, debochando do Judiciário rondoniense (vídeos em anexo). Nos depoimentos coletados, foram colocados nomes fictícios, uma vez que as famílias temem pelas suas vidas.
No dia 31 de março, novo ataque ao acampamento foi feito pela fundiária da área, conforme relatado pelas famílias de Mateus e João Batista. Segundo relataram os camponeses, a agressão iniciou por volta das 14 horas, quando começaram a atirar rumo aos barracos das famílias. Os camponeses se defenderam como puderam, revidando o ataque com espingardas de caça e se refugiaram na floresta. Contudo, quando conseguiram retornar aos seus barracos, constataram que muitos foram destruídos pela ação do fogo, com marcas de tiros; animais de criação sumiram, outros foram mortos ou feridos. “Um horror! Fugimos com a roupa do corpo, levando as crianças”, afirma Maria, esposa de João Batista. “O que mais nos entristece é que o pouco que tínhamos, foi destruído pelos guaxebas, liderados por esse tal Gesulino”, desabafou Raquel, esposa de Mateus.
Outro casal de agricultores, Ester e Marcos, registraram com fotos um dos barracos, com um cão ferido: “Nem os animais eles pouparam! Se fazem isso com a gente, imagine com as nossas criações e roças. Destruíram tudo! Mas nós voltamos e vamos lutar, porque essa terra é nossa”, afirmaram. Uma semana após os primeiros incidentes, inúmeros relatos denunciam que mais de 10 caminhonetes com homens fortemente armados circulam na região e se concentram na entrada da área. Uma grande movimentação que conta com a participação de viaturas da Polícia Militar, retroescavadeiras e tratores. “Eles querem expulsar todos daqui e ainda por cima, destruir a floresta, nessas horas não se vê o IBAMA ou SEDAM intervindo”, afirmou Calebe. “Eles nos chamam de bandidos, mas essa terra era pra ser destinada para a reforma agrária e aparece esse grileiro e assassino se dizendo dono. Essas terras são dos que querem viver e trabalhar! Veja as nossas roças e nossos calos nas mãos”, se emociona Noemi.
As famílias se referem a Gesulino Cesar Travagine Castro – o que agora se apresenta como suposto dono – que, segundo eles, deveria estar preso por ser o mandante de diversos homicídios, coordenar a pistolagem na região de Ariquemes e já ser condenado por uma chacina ocorrida em abril de 2012 na cidade de Buritis, na Linha C-34, Projeto de Assentamento Rio Alto. Na ocasião, seis pessoas morreram, o crime foi elucidado pela polícia civil e Gesulino confessou ser o mandante da ação que vitimou agricultores e compradores de gado (Fonte: https://rondoniaovivo.com/noticia/geral/2012/05/30/buritis-justica-nega-habeas-corpus-a-gesulino-castro-mandante-de-chacina.html)
O incidente ganhou repercussão à época uma vez que um policial civil e um policial penal que faziam segurança privada também foram mortos na emboscada organizada pelo chefe da pistolagem. Gesulino César teve sua prisão decretada por, em tese, ter praticado o crime previsto no art. 121 (homicídio), §2º, I (mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe) e IV (à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido) do Código Penal, por cinco vezes. (Disponível em: https://www.rondoniagora.com/policia/justica-mantem-preso-acusado-de-5-homicidios-em-buritis e https://sgc.com.br/noticia/5/397362)
O mandante da Chacina de Buritis, mesmo condenado segue solto, apesar de cometer outro crime em 2014 e ter sido preso em flagrante na cidade de Ariquemes com armas e coletes. (https://www.extraderondonia.com.br/sistema/2014/01/03/dupla-envolvida-em-chacina-e-presa-com-armamento-e-colete/). Embora amplamente denunciada a sua atuação nos ataques contra agricultores e a longa lista de processos que responde, Gesulino segue atuando na região de Machadinho D’Oeste e o clima de tensão tem aumentado nos últimos dias.
Em nova investida contra o acampamento Gedeon no último dia 26 de abril, um grupo de pistoleiros seguia escoltando uma equipe de trabalhadores que estavam fazendo derrubada em uma área de mata na área do acampamento. Conforme denúncia dos acampados, os pistoleiros abriram fogo contra as famílias, utilizando os trabalhadores como escudo humano. No incidente, 04 trabalhadores foram feridos e um outro foi deixado para trás. “Não somos criminosos, prova disso é que não fizemos nenhum mal contra o trabalhador que ficou para trás”, afirmou um dos camponeses. O clima de terror tem seguido nos projetos de assentamentos vizinhos, com relatos de que pistoleiros invadem casas, ameaçaram e agrediram pessoas nas estradas vicinais no último dia 28 de abril.
O Relatório circunstanciado com imagens e depoimentos será disponibilizado nos próximos dias e será encaminhado aos órgãos governamentais e à imprensa.